Tags
bob Dylan, cultura, forró, Jackson do Pandeiro, música, Nordeste, sertão, Zé Limeira, zé ramalho
Zé Ramalho é o Bob Dylan do Sertão. Claro, Dylan tem uma cadencia própria muito parecida com a de João Gilberto… Brinca com a métrica. Já Zé Ramalho, tem voz cavernosa, grave, fala-cantada; ele minimiza a melodia para incorporar entonações da fala. É um pregador, um pastor, um padre… de voz empostada. Fala como se falasse de cima de um coreto e com entonações que têm sua própria musicalidade.
Quando eu morava na residência universitária, tinha várias amigos que adoravam o Zé… Certa vez, numa daquelas longas conversas de mesa de bar, a prosa deu no Zé. Elogios prá lá, criticas prá cá, etc. Críticas às letras, dizendo que não compreendiam, etc. De repente, Genival, um piauiense, de Floriano, acadêmico de medicina, falou: “menino, eu também não entendo, não! mas o ‘homi’ canta com uma certeza tão grande que deve dizer alguma coisa!”.
Na verdade, tanto Bob Dylan como Zé Ramalho são proféticos em suas composições, em parte pelo teor messiânico e tom de voz que empregam. São vozes que têm algo da certeza inabalável e alucinatória dos profetas, como bem dizia meu amigo, Genival. Ou seja, a certeza de quem viu algo e pouco lhe importa se os outros conseguem ver o mesmo ou não.
O Zé vem do sertão paraibano, de brejo do cruz. Ele foi parido aos sons dos desafios de viola; cresceu ouvindo aboios, repentes e vendo pegas de boi. Sua poética é, portanto, oral. Tem ritmos, inflexões, geniais. Quando nasceu enfiaram uma viola goela abaixo juntamente com versos tirados dos cordéis e das cantorias ouvidas numa sala de reboco.
Para entender Zé Ramalho temos que ter leitura e essa leitura é àquela que é cantada no microfone, coberto por uma flanela amarela, das feiras livres como quando se faz o merchandising do cordel. É preciso ter presente a oralidade, do contrário, não se entende nada mesmo.
Espirituoso o teu texto ao falar do talento do Zé.
A voz dele é sobrenatural tal a força que alcança em nós, sim?
As letras, proféticas e cheias de sabedoria.
As melodias, raras.
Adorei ler no teu texto que “ele minimiza a melodia para incorporar entonações da fala”, eu não entendo de música, embora adore poesia, fiquei pensando: a entonação da voz é o que dá a melodia?
Gostei muito do teu texto, voltarei. Obrigada pela leitura sobre o Grande Zé Ramalho. Vida longuíssima a Ele!
Olá, Sandra!
pois é, o Zé Ramalho é incrível … uma lenda. Penso que é um dos caras mais identificado com a juventude, (90/00) mesmo ele sendo de outra geração… seu trabalho é de um surrealismo… que une rock com repente. Quanto a tua pergunta, não sei nem se sei responder pois não sou músico…mas entendo que quando a gente fala entonamos a voz, né? A frase tem altos e baixos.. quer dizer: tom de voz não é constante… damos enfase à algumas palavras, etc.. Pois bem, na música, a frase é colocada dentro da melodia e a entoação da frase diz respeito às mudanças de tons melódicos que ocorre. As músicas do Zé, por exemplo, Avorai, ” Um velho cruza a soleira de botas longas/ De barbas longas / De ouro, o bruto do seu colar”. Esses versos são ditos num mesmo tom.. é aí que eu entendo que a melodia fica pequena e dar lugar a entonação da voz…E não é só nessa música… percebo isso em todas as que eu conheço… Bom, eu entendo assim.. rss.
Eu quero agradecer, de coração, sua visita… E fico feliz por ter gostado das besteiras que escrevi. Espero ver vc mais vezes… Ah! só mais uma coisinha: vc tem blog? Manda prá mim o endereço.. quer fazer te fazer uma visita.
Abs,
Melqui
Oi, Melqui, vim visitar o teu blog de novo e encontrei tua resposta, obrigada, essa questão da melodia da voz e entonação é bem poética, nunca havia pensado com muita atenção sobre isso, vou re-re-re-pensar, melodia X entonação. Eu queria entender mais isso de literatura de cordel.
Olhe, tenho alguns blogs sim, mas acho que só vale à pena dar uma espiada nas ‘flores do mal’, linkei aí na opção que abre ‘site’ (está meio abandonado e não tem ainda texto sobre o Zé, mas vai ter 🙂
um abraço de Avôhai